Não, meus caros, a Apple não nos mandou 14 iPhones para sortearmos entre
vocês
Se você parar para analisar bem, embora o Second Life tenha deixado de
ser um sucesso quando ainda era uma promessa, sua metáfora continua muito viva,
porque traduz a essência da relação bio-bits que torna cada vez mais
imperceptível a fronteira entre homem e máquina, elementos que, na lógica das
"cibersociedades" (interpretadas aqui como a fusão completa do
digital com o biológico), serão (são?) indissociáveis. Com a popularização do
Facebook, então, nosso alterego binário alcança uma relevância à qual se imaginou
termos chegado na era de ouro do Orkut, mas só agora temos uma noção de quão
grande ela é e de quanto pode ser maior, dado o potencial de engajamento da
rede de Mark Zuckerberg, que consegue prender usuários por horas a fio,
vouyerizando, jogando, vendendo, comprando, denunciando, mobilizando.
Diante desse cenário, o que não faltam são estudiosos competentes,
curiosos atentos e, claro, pseudoespecialistas que – embora, na maioria das
vezes, apenas repliquem o óbvio – acabam também contribuindo para a difusão de
percepções importantes sobre esses novos paradigmas. Ao mesmo tempo, temos
seres humanos cada vez mais informatizados, sejam os chamados nativos digitais,
sejam os forasteiros de décadas atrás que têm se adaptado à inexorável nova
realidade. Todos retuitam, curtem, compartilham e acham que analisar letras de
músicas em comunidades já é mera orkutização démodé (utilizar expressões
francesas, então, é coisa da vovozinha!). Mesmo assim, muitos continuam
ingênuos.
Tenho acompanhado a movimentação dos virais do Facebook e, dentro desse
conjunto, uma parcela me chama bastante atenção por conseguir repercussão
explorando as mesmas estratégias – no mínimo, questionáveis – utilizadas pelos
spammers de e-mail no início da internet. Isso mesmo: as correntes não
morreram. E continuam vivas porque ainda há quem acredite nelas e em mentiras
ainda mais inacreditáveis.
Há um tempo, começaram a circular no Facebook imagens de pessoas doentes
para quem a rede doaria alguns centavos a cada compartilhamento, crianças
desaparecidas (uma menina, inclusive, velha conhecida dos e-mails, já deve ter
o dobro da idade informada na mensagem, pelo tempo em que está sendo
"procurada" virtualmente) e a mais nova versão do mesmo golpe: os
sorteios de produtos da Apple. Tudo com a mesma mecânica e o mesmo objetivo:
conseguir público. Com a diferença de que, nos e-mails, os spammers procuravam
(e ainda procuram) endereços para montar bases gigantescas e vendê-las em
seguida, enquanto no Facebook fanpages garimpam curtidores para, com um grande
público formado, comercializar ações na rede voltadas para esses
"fãs", que permanecerão lá curtindo e compartilhando o que os
golpistas postam.
Conquistar
audiência, batalhar por isso e trabalhar comercialmente as conquistas não é
feio, não é mal nenhum. É o que o rádio, a TV, o jornal, a revista, o blog, o
site e você, com seu perfil no Facebook ou no Twitter, procuram. É assim que as
mídias funcionam e nós nos fazemos ouvir nas redes. Mas tudo tem limite. Ou
deveria ter. Na prática, uma parcela significativa das "ações bem
sucedidas" tem ido até onde a ingenuidade dos usuários permite. E, pode
ter certeza: elas têm ido longe.
Nesta semana,
uma fanpage iniciou uma "promoção" que sortearia vários iPhones e a
postagem foi compartilhada por centenas de milhares de usuários. Poucas horas
depois, outras páginas iniciaram ações semelhantes, com "sucesso"
parecido. O país Facebook Brasil se engajou. Um mar de gente esperançosa de
levar fácil um objeto de desejo para casa. Todos enganados por uma das maiores
trollagens dos últimos tempos, que – na prática – não tem graça. É crime.
Aqui no
Administradores, contamos hoje com cerca de 85 mil seguidores no Twitter e mais
de 130 mil fãs no Facebook. Mas não são os números que nos orgulham, é a
consciência de que – por mais híbrida que a humanidade se torne – estaremos
sempre lidando com pessoas, que pensam, sentem e agem. Respeitamos e valorizamos
a inteligência do nosso público e não apostamos na fraude para conseguirmos
vantagens, assim como várias outras marcas que também fazem questão de usar
sempre da boa fé na internet. Faça também sua parte, internauta. Leia antes de
compartilhar. Duvide antes de acreditar. Não acredite na primeira promessa
milagrosa que lhe fizerem. É triste, mas precisamos dizer: a Apple não doa
iPhones para sorteios.
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